terça-feira, maio 21, 2013

Gostar? Do quê?

Não gostar de nada tem que ser uma virtude.
Não gostar de música, não gostar de bola, não gostar de falar,
não gostar gostar de estar, não gostar de fazer.
Não gostar de nada.
Não gostar de nada tem que ser, porque tem que ser.
É ficar só a estar sem gostar e não gostar de verdade.
Viver aflito por não querer, não querer saber.
Afinal só gostar de quem se gosta.
Isto tem que ser uma virtude.
Nada entusiasmar, nada surpreender.
Isto acontecer apenas e só na excepção,
do coração, físico, mecânico, que reclama e acelera.
Não gostar de nada tem que ser uma virtude.
Gostar só da mãe e do pai
gostar só do sol e do ar
mas não gostar de nada.
Viver na contradição de contrariar
de não procurar melhor nem pior.
Só não gostar de nada.
Deixar que os pés se descoordenem,
que a vista desfoque e que tudo pareça mal.
Não gostar de dormir, de ficar aqui.
Ir embora, não gostar de partir,
não querer ir.
Porque não?
É a contradição que alimenta toda e qualquer questão.
Dizer que não se quer uma coisa porque se pensa outra.
Só gostar do que eu penso?
Nem isso. Não gostar sequer do que penso.
Acumular frustração.
No carro, em casa.
No trabalho que não se gosta.
Não gostar de nada nem é viver.
Só gostar de tudo.
Não se pode gostar de tudo?
Pode. Escolher o que se gosta e não gostar do que não se gosta.
Simplificar o complicado e complicar o simplificado.
Procurar e não procurar.
Juntar tudo.
Desfazer.
Tornar a fazer.
Não gosto de nada, é simples.
O que é meu é.

terça-feira, abril 02, 2013

De sobremaneira.

Quero que tu te fodas, a sério, que tu te fodas.
Simples como é dizer aquilo que se quer dizer
que se quer fazer ver e dizer:
Quero que tu te fodas.

Um palavrão ou dois sempre libertam alguma tensão
mas articular o que realmente é verdade custa nos dedos
como quando está frio, muito frio.

O que quero é o que na verdade se desmonta
e se se desmonta não há outra forma de ser justo
que te fodas.
Não se caminha só, sozinho, dependente, inocente
Não se caminha para o abismo sem uma reflexão
profunda, dolorosa e consciente
Não se pára nunca à determinação
não se determina a dor da emoção.

Os meus dotes são os meus dotes
os meus potes são os teus gracejos inocentes
porque quero que tu te fodas
à parte, como quem brinca.

Iluminando:

'que tu te fodas' é uma expressão que determina o que não queres, o que não gostas,
que não me chateies, talvez que te magoes só um pouco com a insipiência de não querer saber
de não parecer entender que nós, todos, aqui, nos encontramos ligados uns aos outros
com simples necessidade de cuidarmos uns dos outros, de nos suportarmos uns aos outros
de nos ajudarmos a crescer como seres que não se deixam ficar sós.
'quero que tu te fodas' determina que há um momento em que a atenção se concentrou algures no centro da tua barriga, para dentro. Nós de dentro para fora só determinamos aquilo que sabemos comunicar e se o problema é não saber comunicar também posso sempre tentar compreender. Ainda assim não mudo a afirmação.

 Se não há necessidade de comunicar então que se exile e se eremite quem por si se quer viver, aprender para si. É bonito enriquecer a cabeça e o espírito mas ser sem querer e foder sem querer
não é mais que definhar, sem tentar. Não se entende que o mundo assim seja, a definhar, mas compreende-se rapidamente que querer saber de quem não quer saber se torna um desafio demasiado alto.

Tu não consegues nada sozinho. Podes até achar que sim. Podes até provar que sim, mas no fim tu não consegues nada sozinho.

sábado, março 02, 2013

Pudessem os ouvidos.

Pudessem os ouvidos escrever o que são
o que dão na entrada da sala
e na saída da rua
pudessem as sombras ser só sombras
só retratos de dias
de coisas úteis que se fazem para lá.

Pudesse o chão não fugir
o céu ficar parado
pudesse tudo parar para não me deixar mais
pudesse ir eu ali
ficar cá e tornar a vir daqui

Não é de branco
é de preto
o mundo muda
e é hoje

Não é de branco
é de preto
e os passos que se seguem
determinam.

terça-feira, fevereiro 26, 2013

Então é.

Nunca fui de coisas alegres.
Não sei porquê mas nunca fui de coisas alegres.
Sempre tive esperança.
Esperança que as coisas mudassem.
Não mudou nada disso mas vejo o meu país afundado na sua própria desilusão
vejo os dias somarem-se, pessoas a desertarem e a deixarem o melhor arder.
Não sei mas nunca fui de canções alegres.
Houve um dia e outro que as corei mas as canções alegres nunca foram para mim.
Torno a ver o país que sempre foi dentro de mim.
Não há muito a dizer,
o país de mim desmonta-se aos poucos, desacredita-se aos poucos
porque os braços não ficam levantados
só se levantam à chegada
ficar nunca foi para nós
é mais ir e voltar mais tarde
como se uma conversa pudesse ser adiada
como se um dia pudesse ser adiado
e permanecemos inertes, cúmplices e coniventes
descrentes do presente a desejar que tudo seja como é fora da nossa casa.
A galinha da vizinha é dela, não é tua
roubá-la não me dá pertença
só a voz é minha
até os sapatos me podem levar
e só a voz é que é minha.
E não adianta gritar porque ao sair do teu corpo é dos outros
e a entrega tem que ser de todos
e a batalha tem que ser de todos
e tudo tem que ser de todos.
Não somos nós sem nos termos uns aos outros
Não nos queremos sós porque somos uns dos outros.
Não é hora, não é tempo, já acabou.

sábado, janeiro 12, 2013

Ando.

O gerúndio que fazendo e andando se recobra
para deixar que a obra se faça correndo ou parando
querendo ou desejando.
O gerúndio do comendo e passando, montando e
ao passar de novas trevas deixar-se de colegas
e passar ao mais além.
É de novo dia dê, dia de outra coisa mais
dia de amar como os demais
mas o corte fica-se a casa.
Deixar passos atrás, esperar como os demais
e heis que tudo se atrasa.
O problema é que não vamos, o problema é o que temos
o problema é o que damos e não damos ao desejar.
Investir, olha que saudade, eu quero mais é a tua metade
e daqui não saio mais.
Não entendes ir à boleia
porque os murros dão-se na traqueia
até acabar o ar.